quarta-feira, dezembro 08, 2010

Bagagem de mão

Uma hora a vida te assalta.

Ela vem caminhando pelo seu rotineiro corpo, rouba o relógio ,e, num pulo de gato, atravessa a esquina dos olhos e deixa alguns traumas como manchas e trajetos profundos no rosto.

Rugas - deita de lado e dorme.

Hoje eu estou aqui numa esquina do Leblon - ainda jovem como a areia da praia, com as linhas que se desmontam quando vem o mar. Eu vou lembrando a cor dos momentos em eu existi nesse azul : felicidade no Arpoador, braço dado às mais levianas vontades, entregue aos verbos primeiros como ser, sentir e saber. Perdida nota de repente encontrada no instrumento. Temporal e infinita em um só momento despido de defeito como são todas as lembranças.

Acorda. Boceja. Levanta,

Bandida. A vida assalta à mão armada com seus refúgios de ontem. E então vc pergunta "que horas são?" ao primeiro relógio, "mas porque afinal se nunca temos tempo para nada, não é mesmo?" ele sorri e lhe responde como um cafajeste daqueles que vieram do Texas ou de algum lugar que tenha homens machistas e sujos em mesas de saloon. E pensa afinal que relógios nunca vão entender as horas - já q só existem em função delas, por irônico feminismo.

Não importa, é bobagem... O que importa é o tempo bandido, que levou os relógios para bem longe das próprias horas.Ele que um dia, no tipo de defeito que não escolhe sexo, vai ser a maldita razão de tudo ser fermento, manteiga e realidade. Tudo diferente do que esperamos do que seria um sonho, ou o final de dia semelhante aos filmes e pinturas.

Ontem, eu vc e Leminsky, encontramos a capa de um velho caderno e nos sentimos eternos.

Todos um dia seremos velhos e mortais. Velhos como a arte discreta e infantil de reparar nas velhas coisas. Talvez não como os velhos safados da praia do Leme, ou os velhos da Lapa, tomando uma cana ou jogando poker. Talvez eu ainda seja um dia uma velha muito moça - já que perco e não encontro o tempo. Talvez ele tenha se escondido para um dia voltar. Talvez. Ficar... velho e o tempo - a incerteza e o talvez.

Um dia eu assalto a vida. Olho pra ela dentro do meu corpo e tiro mais algumas horas para eu deitar na pedra do Arpoador - encontrada como antes. Roubo esse tempo só pra mim e quem sabe na próxima esquina eu sorrirei por lembrar de um ontem mais ontem do que antes.

E ao perceber no meu olhar inédito de antes - e agora de repente, eu deite de lado e durma por todo resto de vida que restou dela mesma. Sem tempo nem pra acordar e pensar: e se chover?

quinta-feira, novembro 18, 2010

Triste é não ser Louco (por Cláudia Rocha)

A loucura é uma válvula de escape sem escapatória.

É quase como tocar um instrumento, fazer yoga ou namorar. Ser louco é uma vaidade tão gigantesca, que muitas vezes é mais importante ser louco do que ser feliz. É assim, como se fosse uma felicidade embutida, porque, de fato, nem toda alegria é intensa como a insanidade.

Como escreveu uma vez Erasmo de Roterdã em "Elogio à loucura", lá pelos 1500 (1511, mais precisamente) destoando-se da a sobriedade dos seus contemporâneos e das técnicas monótonas que vinham sendo utilizadas: Não há diferença entre sábios e loucos, exceto que os loucos são felizes.

A felicidade da loucura não custa muito, apenas um pouco de auto-convencimento. Algo como tocar um instrumento, fazer yoga e namorar. Isso na verdade nem é uma grande sabedoria, mas está perto da natureza do louco, que acredita que toda idéia é válida, independente do vencimento que vem no rótulo delas ou da sua composição.

Apenas um louco poderia acreditar que tocar um instrumento o tornaria mais feliz ou mais rico ou mais louco , ou ainda que viver em sociedade é uma necessidade de segurança baseada no papel desempenhado por uma instituição chamada Estado. Somente um louco faz uma música social, achando que pelas palavras cantadas, alguém pode perceber o que não se percebe ao falar. E dessa forma, percebendo o "de repente", a loucura seria o remédio para todas as coisas (exceto alguns genéricos de farmácia).

O humor de um louco a fazer yoga, e pensar, ironicamente que se concentrar em seu cerne animal o torna mais controlado com o seu corpo do que o resto do mundo. De fato... nem um pouco o que ele proprio consome ou repulsa, afinal... Ele tem a nítida noção de que sua cabeça é um universo aberto propagando o On (liga do desliga há!) de tudo que gira ao seu redor. A sua cabeça não lhe pertence. Cortem-lhe a cabeça. Ele é louco, (pausa para risos)

A pior das felicidades loucas é namorar. Se vc ao perceber que não pertence a si e nem que suas idéias absurdas que "oh!acabam tendo um fundo de verdade para alguém em algum lugar no kilometrico universo", mesmo que esse alguém de fato nunca exista, pois é... intuitivamente vc se apaixona. Vc encontrou o alguém! (salva de palmas) Coitado, ele, o alguém!, carrega - no seu pálido corpo rasgado de uma humanidade heróica - toda a dose de adrenalina e tesão que você (mísero ser destrambelhado) aprisiona na sua hipófise e nas suas neuroses. Vc está amando, ou seja...: vc enloquece sem poréns e põe a culpa na outra pessoa - isso se a (mal)dita não fizer isso antes de você!

Portanto, se vc beira o auto-controle definitivo, mantém certos horários e padrões, dá "ok" em suas atividades cumpridas, arruma a cama e dobra os lençois, não come carboidratos à noite, cuida de 7 filhos, 10 cachorros, 19 gatos, faz yoga, toca um instrumento (harpa?) e namora e... e ainda é feliz!... Acredite... Vc não é feliz porque toca um instrumento, faz yoga ou namora. Vc é feliz porque é completa e - estupidamente - L-O-U-C-O,


                    

domingo, agosto 01, 2010


Composição (por Cláudia Rocha em julho de 2010)

Um dia vão olhar
E ver uma clave de Sol
No meu lugar

Porque eu canto pra não despertar
O dormir que decidiu esperar
pra quando eu acordar daqui

e vc me dizer
com sua boca de veludo
uma frase enfarpada de absurdo

um dia vão me olhar
E ver uma nota em ligato com o céu
sem tocar o chão

Porque eu canto pra não ser eu
Pra não chamar atenção
pra quando eu acordar daqui

e vc me dizer
com sua alma de instrumento
um solo ardendo de flores.

e vc me dizer
com seu ouvido, seus olhos
a melodia/amor que não sai da minha cabeça


quarta-feira, fevereiro 24, 2010

Projétil (Cláudia Rocha - janeiro de 2008)

Eu estou só
Querendo que a noite permaneça
Enquanto eu me mudo
Do minuto de agora
E refaço o mundo
Com a largura de um sorriso
De lembranças passadas

Estou só eu
E a tela fria do tempo
Brincando de futuro
Risonha têmpora de amanhã
Despertada no dia quieto
Eu estou só no plural dos verbos

Esqueçam, vcs neurônios
O segundo e o primeiro desejo
Que fizeram anteontem à sua invisivel estrela
Larguem, vcs braços
O amor não dado à sua palma
Ao arremesso de platéia, vagos
Sonhos esses que vcs deram n'água
E não voltaram nuvem

Sejam, vc - imagem, espelho
Uma pista mínima pro território
Dos olhos e pernas
O enxergar mais que o olhar
E o pisar mais do que o existir

E me recolho só
As muitas de mim mesma na imensidão
Apagando os fósforos de cada dedo
De cada gesto seu que é aquém
Numa ciranda de mãos às idéias
Ressonando e me vendo dormir
Quase caindo do teto do porém
Do existir

quarta-feira, fevereiro 17, 2010

O dito pelo não dito

Poesia primeira (por Cláudia Rocha/ 31/12/2009)

Como se eu fosse inteira
construida de vazios
E matérias
Eu gostaria de ser o silêncio
sapiente das coisas concretas

Mas como sou de água
Odor e alfabeto
Apenas posso ser
Humana, gesto
e instrumento

Se eu pudesse ser astro
Teria menos dores de cabeça
Soltaria raios nos olhos
E queimaria meus inimigos

Mas por ser mulher
Apenas evaporo como a nuvem
Matéria fêmea
E humano vazio

E seria flor até
Se alguém me desse
Um puxão arrancador da terra
Mas meu homem cheira os cabelos
E apenas me deixa na lama
Das raízes bem presas

Eu seria mais livre
Se não fosse esse corpo
Ao fundo do copo
Que você bebe

Mais penumbra
se não fosse essa luz
Que os seus olhos procuram
Com tanta sede e fome

E se pudesse ser de outra õrbita
Seria um satélite à parte
Uma Lua entre Vênus e Marte
Inabitada para não ser planeta









terça-feira, fevereiro 16, 2010

A paixão de cinzas



(por Cláudia Rocha - 2009/dezembro)

Moça que me olha da janela
Não quero ouvir mais dela
Um som saindo da boca

Quero dizâ-la, acordá-la
E deixá-la acesa
No apagado da noite toda

Vou sentir o frio de seus membros
Ainda mais frios por dentro
E ainda mais frios por serem menos meus

E por mais que me olhe do outro lado
A entenderei o tom amrgo
O piano molhado de música
E os lábios

Moça que se perde na estrada
E me olha na janela
Não quero ver sua cara
Sua palidez de fada

Quero deixá-la fadada
Deixá-la acesa a noite toda
No apagado da lembrança

Como uma dança de ontem que me recusou
Como um beijo de hoje maldito
E um não que não pensou

Um grito

Moça molhada na minha janela
Espelho de uma realidade estúpida
De um mundo onde o pensar raivoso
Não é semente ou sequer murta

Ela está morta, sujeito
Ela, moça, paixão
Não se levanta do meu peito

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

É Carnaval - o ano começou com confetes .º. º;º..

O pOEMA CRU

(por Cláudia Rocha - fevereiro 2010)


Te encontro os olhos rudes
Brincando na boca larga
A voz da minha tragédia em silencio

E como se não tivessse dimensão para ir
Eu parto o que não compartilho
essa tua firmeza de círco
Nos traços emprestados do palhaço

Eu te sorrio pra não chorar
E te encontro, incontestável
Ainda gemendo, alardeado
A voz do mais profundo amor

Ainda que de amor não seja feita a vida
A gente pinta o borralho de sangue
E a inocência escorre pura
Nas veias das flores arrancadas

Ainda que de vida não sejam feitas
As palavras que vc morde aos solavancos
Eu te olho tímida - e profundamente
E sem querer partir
Te amo, destemperadamente
A voz que se cala
com o coração batendo