segunda-feira, dezembro 26, 2011

Meu tempo é quando

Meses, anos, dias. Tudo com seu q de planeta, espaço-tempo, temporalidade urgente.
Na filosofia de "morrer ontem e nascer amanhã" o ano não começou e nem, quiçá, terminará.
Guardem seus fogos de artifício, escondam suas camisas coloridas e suas expectativas de mera saliva. Nada vai mudar se os ponteiros não forem pernas, se os verbos não forem gestos - se o breve calendário não couber na brevidade da vida.
(Um dia eu acordei e era Carnaval - noutro também, não nos limitemos mais.)
Desejem hoje, manifestem, façam.
E não voltem aqui enquanto não estiver pronto, aceso, ocupando espaço no tempo.

[Todo dia é um reveillon ilimitado de horas]


*pintura - Salvador Dali "A persistência da memória"

quinta-feira, setembro 08, 2011

Voltando a ser (baseado em estar sendo/ter sido *Hilda Hilst)


Estar sendo (por Cláudia Rocha, julho de 2011)

O antes não me comove
De frente pro agora
Estamos distantes de amanhã
Mais perto da memória

Se antes, meus quadris largos
Parecem agora estreitos fardos
Sobre o volume das pernas

Se ainda antes meus ombros
pareciam pequenos
Junto aos braços

Hoje é maior o peso
Do piano nas costas
Mas é melhor a qualidade da música
São mais firmes os sapatos

Se antes eu tinha mais curvas
Hoje sou mais mulher
Dos pés á cabeça,
na dimensão da barriga

Se antes eu tinha feridas
Abertas no infinito do obscuro
Hoje eu danço no claro
Aceso como uma lâmpada

Se antes eu tinha sonhos
Hoje eu tenho o tempo de fundá-los
Hoje eu tenho ossos
Choros, lanhos

O antes, jovem, senil
Cru, etéreo, saboroso
Como uma colher de chocolate

São meus quilos extras
Minhas melhores fotos
Meus amigos que não vão embora

Mas o agora é fato
É pesado e largo
Nem minhas duas coxas aguentam

Mas tudo é muito mais claro
No amanhã desbotado
É preciso mais alma e menos poema

sexta-feira, agosto 19, 2011

Devia ser ilegal ser feliz.
Devia ser como um crime, com direito a mala prateada e um certo suspense no olhar.
Aperto no peito, cheirando a tragédia, a sangue, explosões - não é assim que deveria ser a reação do sorriso?
E o protagonista simplesmente queria dinheiro, amor, mulheres? Não, no meu centro de história, ele queria ser apenas feliz.
Assim qualquer filme trilhardário vira sessão da tarde. Qualquer fim de tarde não doi no fundo do peito.
Alguém devia bater o martelo na Constituição e explicar que é proibido ser feliz, e a gente, fatalmente, iria querer.
Falta emoção na feliciade simples de acordar tarde no escancarado da semana?
Ou o sentimento acostumado de morder chocolate, beijar na boca, essas coisas gostosas.
Nunca lembramos do feriado até que ele acaba.
Teimamos no triste, só pq ele é empolado, escuro, noturno, escondido na gente.

Deveria ser um remédio de tarja preta, uma droga vendida aos sussurros.
Assim, quem sabe, não sobraria ao tédio o braço aberto da felicidade, que a gente só percebe quando se fecha..



quinta-feira, junho 30, 2011

Lado de dentro, lado de fora.



Sonhos são os móveis de uma casa.
Quando somos pequenos, temos a ilusão em tom pastel, de todas as formas. O inédito do mundo assim: às caras. O berço, vira uma mini-cama. Hora de trocar os lençois, e o papel de parede, deixar as chupetas e chocalhos, de parar de levar sustos e entender que não podemos algumas coisas, porém as possibilidades são infinitas. Alguém te dá um pedaço de papel e você faz um desenho bonito e despreocupado. Você já quer andar, já consegue fugir do seu cercado de amparos. Já ri de diversas histórias e daqui a pouco pode aprender sobre contos de fadas e desenhos animados. Seus móveis são enormes e inalcançados, composição de lembranças.

Aos poucos entramos no hiper colorido mundo em quadrinhos das histórias. Nosso maior sonho é uma casa de geléia, um automóvel que voa, um super-herói, um cachorro que fala. Nossas super-coisas são simples, mudam apenas de cor e ganham um pouco mais de solo fertil na terra das invenções. Não conhecemos outra realidade e estamos num quarto totalmente iluminado em que olhar para fora é vil e desnecessario, tendo, no dentro, todos os elementos da soberba diversão, essa: a que buscamos para todo o resto da vida. Aprendemos a ler, ganhamos novos armários e cômodas. Uma boneca gigante, uma cama em formato de foguete. Os objetos tomam a forma divertida das idéias. Fugimos do chão, corremos para o teto. Conhecemos as janelas e os rostos alheios. Temos amigos e jogos para 5 pessoas. Quebra-cabeças, video game, pula-pirata, banco imobiliário. Simulamos o mundo, inventamos um novo, quebramos as grades.
Ficamos velhos e grandes, empurramos os móveis.

Temos agora uma cama, um armário colorido e um poster de algum ídolo. Um skate, um par de patins, bolas de basquete. Nossos sonhos são móveis do nosso tamanho - quase podemos entrar numa marcenaria e fabricá-los. Vestimos a camisa de um time, uma pose de um superstar, uma sapatilha de bailarina. Somos alguém para o mundo que nos aponta: gordos, magros, feios, bonitos, simpáticos, tímidos. Desejamos coisas, pessoas, escancaramos a janela, quase saimos pela boca. Batemos a porta com revolta. Ouvimos o que queremos, sabemos demais, afinal, estamos descobrindo. Somos grandes para muitos momentos e pequenos para todo o resto. Nossas gavetas mal cabem as roupas e idéias. Lemos, pintamos, tocamos, achamos, expressamos. Somos e ponto final, vamos trocar todos esses armários!

Ganhamos um laptop para fazer o dever da escola, uma luminária para os dias que entardecerem. Somos alguma faixa no karatê e algum nível na natação. Temos um blog mimoso para meninas semi-adultas. Lemos revistas de fofocas e fazemos testes. Somos os melhores em Química e participamos do clube de ciências e matemática. Jogamos por muitas madrugadas aplicativos online, sabemos todos os cheats e códigos. Nossas roupas são para os outros, ou simplesmente tanto faz. Depende dos móveis. Alguns já procuram o perfume do pai, outras os saltos da mãe. Importamos coisas para nosso quarto, virtual e real.
Um porta-retrato sobre a cabeceira ou um coração de pelúcia sobre a cama. Um tempo, que voa no relógio da parede.

Jogamos fora os livros do ensino médio e guardamos bem os livros que compramos com o nosso cartão de crédito. Na velha estante só fica o que tecemos com a memória: Literatura, ficcção, história em quadrinho. Na nova estante, livros de Economia, direito constitucional ou teoria política. Jogamos com bom grado, pela porta afora, os velhos livros de vestibular e causas impossíveis. Trocamos os móveis de lugar de novo. Pouco espaço, muitas recordações. Pegamos o velho violão e as velhas jovens coisas, guardamos num local seguro. Separamos a calça social e a blusa na cadeira para o dia seguinte. Algumas maquiagens na estante e produtos de beleza, ou apenas pós barba. Temos um carro, uma moto  ou então  apenas a identidade e a carteira da faculdade. Não temos hora para voltar. Nossos móveis ficam e esquecemos do mundo um pouco para viver o lá fora, além da janela. Ou então ficamos em casa em pleno Sábado à noite, cansados, pós reunião de trabalho, decepções e conquistas. Colocamos as mochilas e bolsas no chão do quarto e dormimos sem porém.

Por vezes, a cama vazia, sente saudades da luz acesa. O lá fora é gigante, e nem sempre voltamos.
Alguém a mais entra no nosso quarto e passa a compartilhar por alguns momentos nossos móveis. Além das pessoas de antes, e dos amigos e amigas, alguém-alguém. Vemos um filme, comemos pipocas, ficamos na internet fazendo bobagens ou lendo coisas interessantes. Ora conhecemos outros móveis, ora mostramos os nossos. Constante ou inconstante, o tempo passa ainda mais depressa. Empurramos os moveis de novo, algumas vezes. Pedimos ajuda pra empurrar, diferente quando eramos crianças e as coisas se mudavam sozinhas. Decidimos por um quarto maior, uma casa amba, mudamos de lugar, levamos os móveis conosco. Alguns põe em guarda-móveis. Alguns jogam fora. Alguns não se mudam não.

De repente, os móveis vão embora para entrar outros. As vezes vão embora para o quarto ao lado. Berço, mini-cama, tons pasteis, tudo de novo fazendo companhia para a sua janela. Pintam sua porta de branco, rodapés, papeis de parede. Então você se vê, dividido ao meio, sendo dois. E o seu tamanho gigante naquele quarto minusculo, vendo do ângulo contrário. E ainda no projeto ou na embalagem - os móveis novos que um dia você vai ajudar a mudar de lugar.


quarta-feira, junho 01, 2011

Boa noite, inferno astral


Enquanto vou vivendo o meu momento em meu mundinho, sinto o "reco-reco" do vizinho de cima desabando sobre a minha cabeça. A água da garagem ao lado, e o latido do cachorro - aquilo que ninguém dá jeito.
Entre uma propaganda de desodorante (ou outra coisa sem sentido) e algum pedaço de filme, piscam as janelas.
Algumas pessoas roncam como portas - ou seriam portas que roncam como pessoas? Alguém deveria colocar óleo nas ferrugens, como aquele carro velho que passa aos soluços. Esse mundo de máquinas tristes, pessoas humanas às vezes.
Ninguém parou para procurar constelação alguma hoje, e esse frio mórbido deixa alguns pensamentos duros como o chocolate que vc esqueceu no freezer. Algumas coisas duras são as palavras do meu vizinho de cima, os uivos lânguidos e provavelmente todo o resto.
Eu queria entender os programas da madrugada. Os fogos comemorando a derrota do time rival, desfile de lingeries, Amaury Jr, Fala que eu te escuto, fama difamada, sacanagens sexuais (e as outras? as verdadeiras sacanagens que ninguém fofoca à noite?), disque qualquer coisa. Muito futebol sendo discutido, muita informação dita por não dita, muito (in)cult nos programas de auditorio, um músico novo, um comediante e uma atriz-modelo querendo um lugar nenhum ou lugar-comum. Procuro em todos os canais e os filmes que eu quero ver e que sempre passam num dia que não estou. Franzindo o cenho: não compreendo.
A torneira da pia só não incomoda mais do que o silêncio. E o reco-reco das camas, e roncos, e luzes na janela, e miados de gato, latidos, girafas bebadas ambulantes antecipando o final de semana. Só falta chover!... e o vão da marquise do vizinho pingar um sem fim de vezes sobre a minha janela mais rápido que a minha capacidade de não pôr o travesseiro sobre o rosto.



Mundinho escuro: 4 membros, paredes, cantos. Algumas das minhas insônias espalhadas na cama jogando cartas, ou discutindo uma com a outra a hora de acordar amanhã. Recorro ao último consolo: laptop e que o wiffi não esteja com sono. Aos poucos encontro a paz de não conseguir dormir na guerra escura das noites claras (fico brega de repente, é sempre de madrugada, sempre assim, repare.). Bisbilhoto todas ascoisas alheias que passam a ser menos alheias do que antes. Sento e escrevo, no "signo que tento crer e ser". Deleto tudo até aqui.
Começo assim:
Meu momento em meu mundinho - e alguns sons da madrugada que definitivamente incomodam.

quarta-feira, maio 11, 2011

Todo o dia é dia das mães

Todo o dia é dia das mães (por Cláudia Rocha)
 
Todo dia é dia das lojas.
Dia de abrir liquidação do estoque anterior. Dia de conferir o caixa.
Dia de pensar na sedução mental mais eficaz, no preço-produto-preço-benefício-custo-lucro... Todo o dia é dia do dinheiro.
Do objeto de plástico. Dia do contra-cheque e dos talões de prazo.

Todo dia é dia do tempo.
Mesmo que ele sempre chegue amanhã e seja tarde demais na maioria das vezes.
Dia de abrir um presente que eu poderia não ter exatamente comprado. Todo dia podemos fabricar algumas coisas e gestos, vitrine a vitrine. Dia de prazos e jobs. Amanhã por exemplo é dia de alguém entregar um caderno de idéias, ou ser seduzido por elas.
Do relógio, da bolsa, do que se deteriora.

Todo o dia é dia de alguma gente.
Mãe, criança, pai, avô, Natal, Coelho da Páscoa. Todo dia tem um preço embutido na minha mão que te agrada.
Dia com etiqueta de lavar com cuidado. Dia pra trocar no outro, pagar parcelado. Todo dia é dia de fabricar uma canção sem som.
Do mesmo modo que olhamos em silêncio, todas as coisas querendo serem compradas por nós.

Todo dia é dia de alguma emoção com preço.
Dia de apreço, de agrado, dia de sermos tolos e financiarmos todos os sonhos dos outros. Dia de parirmos o mundo com a barriga das vontades, colocarmos tudo dentro, e não deixar nem a realidade virtual para fora. Olhar para cada coisa feita, idéia prensada em tecido. Todo dia é dia de abrir os ouvidos e os olhos para cegamente amar e nunca aprender a ouvir as vozes alheias. Todo dia somos um produto no estoque do mundo, e entendemos, preciosos, que somos algo além da mais-valia.
Da mesma prateleira, do mesmo material.

Todo dia vamos ser mais do que podemos ser.
Vamos nos vender e comprar migalhas em troca, ou trocar nossas migalhas por alguma coisa orgânica, viva ou comestível. Todo mundo vai atribuir uma figura à sua embalagem. Todo mundo vai decorar com afinco a sua propria embalagem. Mas todos somos embalagens de presente rasgados nas mãos de crianças, ou da mera ocasião.
Todos os dias nos entregaremos inteiros e voltaremos meios, vendidos e nem sempre comprados.
Todos os dias, mães de tudo, vaidosos, e filhos também: do que restou com a nota fiscal.

domingo, janeiro 30, 2011

Adeus putaria poética...

Como puderam perceber (ou não), dei uma revolucionada!
Decidi que se nem esse blog e nem aquele, pq não uma mistura de dois !
Voltamos a transmissão anterior de textos no formato que quiserem ter.
Aguardem novidades !