domingo, novembro 03, 2013

Para Liz

Quarta feira de cinzas

Eu vou me lavar do Carnaval
Abrir a torneira dos dedos
Deixar de chover confetes

Guardar minha roupa de ilusão
Vou tirar os carros alegóricos
Desabotoar o riso bobo do rosto das pessoas

Vou esvaziar as ruas de piratas
Colombinas, realezas, personalidades e mitos
Meu espelho do mar vai ficar
No escuro da memória

Vou esquecer seus lábios
Seus olhos bonitos
Seu jeito de me amar
Distante e inseguro
Vou deixar meu pássaro na gaiola
Ainda como a poeira de uma fênix
Abrir os armários, guardar as magoas

Mas quando existir de novo
Outra folia como a nossa
Eu vou de peito aberto
Pulando de cabeça
Porque acabo sendo assim
De viver a beça
De dançar a dança
Cair de corpo na alma

Inteira, dou meia volta
No ontem
Na semana
Na folia passageira

Infelizmente ou não
Despenteada, de pijamas e meias
Eu também preciso de alguém
Que me ame as quartas-feiras


segunda-feira, abril 08, 2013

Fotofobia (trecho 2)


(Por Cláudia Rocha - Dezembro de 2012)



Eu queria ter um estúdio de revelar pessoas
Passa-las no líquido químico, acesas
Pendura-las na corda, esperar se secarem

Ver nelas a verdade
Preto no branco
Amarelo no azul
Contraste de luz
Sombra e carne

Eu queria ter alguns verbos
Pra apoiar como uma câmera
E ser ouvida com flashes
De clareza instantânea

Ver sorrisos nos olhos
De quem sabe usar os lábios
Não para sons ou promessas
Mas para guiar com cuidado
Um carro de vidraças

Eu queria ter uma realidade
Virtual como todas
Só pra viver eu e você
Ou quem eu pensei que você fosse

Eu queria ter mundos
Pra sonhar os meus sonhos
Dirigir um teatro de amores
Sem hematomas

Eu queria ter o controle
Sobre o descontrole dos ossos
Eu queria alcançar os dedos
Te pedir e receber o meu tempo de volta

Eu queria caber nessas palavras
Que constam nas imagens reveladas
Eu queria ver seu sorriso de verdade
Eu queria de verdade sorrir e querer

Levar pra casa obras de arte
Ao invés de fotografias antigas
Que não dá vontade de ver.




quarta-feira, julho 04, 2012

Pra todos os males


Pra todos os males (por Cláudia Rocha. junho 2012)

Cura pra insônia
Remédio pra saudade
Alguém tem?

Terapeuta pras horas
Fisiculturista pros verbos
Quanto cobram?

Encontrar na dobra da esquina
Sua face plana, quase desenhada
Me convidando a estar no seu peito
E sair inteira (?) depois de rasgada

Existe algum problema com solução
Ou apenas a solução 
Que a gente problematiza?

Existe mesmo
É algum defeito na garganta
Quando só saem palavras
E não gemidos




domingo, maio 27, 2012

The Moon



Edifício (Janeiro 2012 - por Cláudia Rocha)


Minhas paredes me contaram
Que existia um edificio
Uma especie de escada
Rumo ao precipício
Meias palavras em papel ofício
Por mais que fosse cego
O meu vício de ser seu ébrio
Abrigo misto
De heroismo, ego
Tais como memórias
De pular do abismo

Mas antes eu fosse eu
Somente, e não precisaria
Do andar ausente
Sacadas, janelas
Hall de entrada
Dentro dos meus passos

Mas antes eu fosse pó e cal
Dormente
Na beira da estrada
Os sapatos nao contariam nada
Ficariam guardados na caixa
Da historia descriada
Ferramentas imaculadas
Intocadas asas

Se antes de construirem a cidade
Sobre cada esquina prescrita
Cada ontem com endereço
Sem rumo eu me perco
Na sua morada
Arrasada ruina de desejos

segunda-feira, dezembro 26, 2011

Meu tempo é quando

Meses, anos, dias. Tudo com seu q de planeta, espaço-tempo, temporalidade urgente.
Na filosofia de "morrer ontem e nascer amanhã" o ano não começou e nem, quiçá, terminará.
Guardem seus fogos de artifício, escondam suas camisas coloridas e suas expectativas de mera saliva. Nada vai mudar se os ponteiros não forem pernas, se os verbos não forem gestos - se o breve calendário não couber na brevidade da vida.
(Um dia eu acordei e era Carnaval - noutro também, não nos limitemos mais.)
Desejem hoje, manifestem, façam.
E não voltem aqui enquanto não estiver pronto, aceso, ocupando espaço no tempo.

[Todo dia é um reveillon ilimitado de horas]


*pintura - Salvador Dali "A persistência da memória"

quinta-feira, setembro 08, 2011

Voltando a ser (baseado em estar sendo/ter sido *Hilda Hilst)


Estar sendo (por Cláudia Rocha, julho de 2011)

O antes não me comove
De frente pro agora
Estamos distantes de amanhã
Mais perto da memória

Se antes, meus quadris largos
Parecem agora estreitos fardos
Sobre o volume das pernas

Se ainda antes meus ombros
pareciam pequenos
Junto aos braços

Hoje é maior o peso
Do piano nas costas
Mas é melhor a qualidade da música
São mais firmes os sapatos

Se antes eu tinha mais curvas
Hoje sou mais mulher
Dos pés á cabeça,
na dimensão da barriga

Se antes eu tinha feridas
Abertas no infinito do obscuro
Hoje eu danço no claro
Aceso como uma lâmpada

Se antes eu tinha sonhos
Hoje eu tenho o tempo de fundá-los
Hoje eu tenho ossos
Choros, lanhos

O antes, jovem, senil
Cru, etéreo, saboroso
Como uma colher de chocolate

São meus quilos extras
Minhas melhores fotos
Meus amigos que não vão embora

Mas o agora é fato
É pesado e largo
Nem minhas duas coxas aguentam

Mas tudo é muito mais claro
No amanhã desbotado
É preciso mais alma e menos poema

sexta-feira, agosto 19, 2011

Devia ser ilegal ser feliz.
Devia ser como um crime, com direito a mala prateada e um certo suspense no olhar.
Aperto no peito, cheirando a tragédia, a sangue, explosões - não é assim que deveria ser a reação do sorriso?
E o protagonista simplesmente queria dinheiro, amor, mulheres? Não, no meu centro de história, ele queria ser apenas feliz.
Assim qualquer filme trilhardário vira sessão da tarde. Qualquer fim de tarde não doi no fundo do peito.
Alguém devia bater o martelo na Constituição e explicar que é proibido ser feliz, e a gente, fatalmente, iria querer.
Falta emoção na feliciade simples de acordar tarde no escancarado da semana?
Ou o sentimento acostumado de morder chocolate, beijar na boca, essas coisas gostosas.
Nunca lembramos do feriado até que ele acaba.
Teimamos no triste, só pq ele é empolado, escuro, noturno, escondido na gente.

Deveria ser um remédio de tarja preta, uma droga vendida aos sussurros.
Assim, quem sabe, não sobraria ao tédio o braço aberto da felicidade, que a gente só percebe quando se fecha..



quinta-feira, junho 30, 2011

Lado de dentro, lado de fora.



Sonhos são os móveis de uma casa.
Quando somos pequenos, temos a ilusão em tom pastel, de todas as formas. O inédito do mundo assim: às caras. O berço, vira uma mini-cama. Hora de trocar os lençois, e o papel de parede, deixar as chupetas e chocalhos, de parar de levar sustos e entender que não podemos algumas coisas, porém as possibilidades são infinitas. Alguém te dá um pedaço de papel e você faz um desenho bonito e despreocupado. Você já quer andar, já consegue fugir do seu cercado de amparos. Já ri de diversas histórias e daqui a pouco pode aprender sobre contos de fadas e desenhos animados. Seus móveis são enormes e inalcançados, composição de lembranças.

Aos poucos entramos no hiper colorido mundo em quadrinhos das histórias. Nosso maior sonho é uma casa de geléia, um automóvel que voa, um super-herói, um cachorro que fala. Nossas super-coisas são simples, mudam apenas de cor e ganham um pouco mais de solo fertil na terra das invenções. Não conhecemos outra realidade e estamos num quarto totalmente iluminado em que olhar para fora é vil e desnecessario, tendo, no dentro, todos os elementos da soberba diversão, essa: a que buscamos para todo o resto da vida. Aprendemos a ler, ganhamos novos armários e cômodas. Uma boneca gigante, uma cama em formato de foguete. Os objetos tomam a forma divertida das idéias. Fugimos do chão, corremos para o teto. Conhecemos as janelas e os rostos alheios. Temos amigos e jogos para 5 pessoas. Quebra-cabeças, video game, pula-pirata, banco imobiliário. Simulamos o mundo, inventamos um novo, quebramos as grades.
Ficamos velhos e grandes, empurramos os móveis.

Temos agora uma cama, um armário colorido e um poster de algum ídolo. Um skate, um par de patins, bolas de basquete. Nossos sonhos são móveis do nosso tamanho - quase podemos entrar numa marcenaria e fabricá-los. Vestimos a camisa de um time, uma pose de um superstar, uma sapatilha de bailarina. Somos alguém para o mundo que nos aponta: gordos, magros, feios, bonitos, simpáticos, tímidos. Desejamos coisas, pessoas, escancaramos a janela, quase saimos pela boca. Batemos a porta com revolta. Ouvimos o que queremos, sabemos demais, afinal, estamos descobrindo. Somos grandes para muitos momentos e pequenos para todo o resto. Nossas gavetas mal cabem as roupas e idéias. Lemos, pintamos, tocamos, achamos, expressamos. Somos e ponto final, vamos trocar todos esses armários!

Ganhamos um laptop para fazer o dever da escola, uma luminária para os dias que entardecerem. Somos alguma faixa no karatê e algum nível na natação. Temos um blog mimoso para meninas semi-adultas. Lemos revistas de fofocas e fazemos testes. Somos os melhores em Química e participamos do clube de ciências e matemática. Jogamos por muitas madrugadas aplicativos online, sabemos todos os cheats e códigos. Nossas roupas são para os outros, ou simplesmente tanto faz. Depende dos móveis. Alguns já procuram o perfume do pai, outras os saltos da mãe. Importamos coisas para nosso quarto, virtual e real.
Um porta-retrato sobre a cabeceira ou um coração de pelúcia sobre a cama. Um tempo, que voa no relógio da parede.

Jogamos fora os livros do ensino médio e guardamos bem os livros que compramos com o nosso cartão de crédito. Na velha estante só fica o que tecemos com a memória: Literatura, ficcção, história em quadrinho. Na nova estante, livros de Economia, direito constitucional ou teoria política. Jogamos com bom grado, pela porta afora, os velhos livros de vestibular e causas impossíveis. Trocamos os móveis de lugar de novo. Pouco espaço, muitas recordações. Pegamos o velho violão e as velhas jovens coisas, guardamos num local seguro. Separamos a calça social e a blusa na cadeira para o dia seguinte. Algumas maquiagens na estante e produtos de beleza, ou apenas pós barba. Temos um carro, uma moto  ou então  apenas a identidade e a carteira da faculdade. Não temos hora para voltar. Nossos móveis ficam e esquecemos do mundo um pouco para viver o lá fora, além da janela. Ou então ficamos em casa em pleno Sábado à noite, cansados, pós reunião de trabalho, decepções e conquistas. Colocamos as mochilas e bolsas no chão do quarto e dormimos sem porém.

Por vezes, a cama vazia, sente saudades da luz acesa. O lá fora é gigante, e nem sempre voltamos.
Alguém a mais entra no nosso quarto e passa a compartilhar por alguns momentos nossos móveis. Além das pessoas de antes, e dos amigos e amigas, alguém-alguém. Vemos um filme, comemos pipocas, ficamos na internet fazendo bobagens ou lendo coisas interessantes. Ora conhecemos outros móveis, ora mostramos os nossos. Constante ou inconstante, o tempo passa ainda mais depressa. Empurramos os moveis de novo, algumas vezes. Pedimos ajuda pra empurrar, diferente quando eramos crianças e as coisas se mudavam sozinhas. Decidimos por um quarto maior, uma casa amba, mudamos de lugar, levamos os móveis conosco. Alguns põe em guarda-móveis. Alguns jogam fora. Alguns não se mudam não.

De repente, os móveis vão embora para entrar outros. As vezes vão embora para o quarto ao lado. Berço, mini-cama, tons pasteis, tudo de novo fazendo companhia para a sua janela. Pintam sua porta de branco, rodapés, papeis de parede. Então você se vê, dividido ao meio, sendo dois. E o seu tamanho gigante naquele quarto minusculo, vendo do ângulo contrário. E ainda no projeto ou na embalagem - os móveis novos que um dia você vai ajudar a mudar de lugar.


quarta-feira, junho 01, 2011

Boa noite, inferno astral


Enquanto vou vivendo o meu momento em meu mundinho, sinto o "reco-reco" do vizinho de cima desabando sobre a minha cabeça. A água da garagem ao lado, e o latido do cachorro - aquilo que ninguém dá jeito.
Entre uma propaganda de desodorante (ou outra coisa sem sentido) e algum pedaço de filme, piscam as janelas.
Algumas pessoas roncam como portas - ou seriam portas que roncam como pessoas? Alguém deveria colocar óleo nas ferrugens, como aquele carro velho que passa aos soluços. Esse mundo de máquinas tristes, pessoas humanas às vezes.
Ninguém parou para procurar constelação alguma hoje, e esse frio mórbido deixa alguns pensamentos duros como o chocolate que vc esqueceu no freezer. Algumas coisas duras são as palavras do meu vizinho de cima, os uivos lânguidos e provavelmente todo o resto.
Eu queria entender os programas da madrugada. Os fogos comemorando a derrota do time rival, desfile de lingeries, Amaury Jr, Fala que eu te escuto, fama difamada, sacanagens sexuais (e as outras? as verdadeiras sacanagens que ninguém fofoca à noite?), disque qualquer coisa. Muito futebol sendo discutido, muita informação dita por não dita, muito (in)cult nos programas de auditorio, um músico novo, um comediante e uma atriz-modelo querendo um lugar nenhum ou lugar-comum. Procuro em todos os canais e os filmes que eu quero ver e que sempre passam num dia que não estou. Franzindo o cenho: não compreendo.
A torneira da pia só não incomoda mais do que o silêncio. E o reco-reco das camas, e roncos, e luzes na janela, e miados de gato, latidos, girafas bebadas ambulantes antecipando o final de semana. Só falta chover!... e o vão da marquise do vizinho pingar um sem fim de vezes sobre a minha janela mais rápido que a minha capacidade de não pôr o travesseiro sobre o rosto.



Mundinho escuro: 4 membros, paredes, cantos. Algumas das minhas insônias espalhadas na cama jogando cartas, ou discutindo uma com a outra a hora de acordar amanhã. Recorro ao último consolo: laptop e que o wiffi não esteja com sono. Aos poucos encontro a paz de não conseguir dormir na guerra escura das noites claras (fico brega de repente, é sempre de madrugada, sempre assim, repare.). Bisbilhoto todas ascoisas alheias que passam a ser menos alheias do que antes. Sento e escrevo, no "signo que tento crer e ser". Deleto tudo até aqui.
Começo assim:
Meu momento em meu mundinho - e alguns sons da madrugada que definitivamente incomodam.

quarta-feira, maio 11, 2011

Todo o dia é dia das mães

Todo o dia é dia das mães (por Cláudia Rocha)
 
Todo dia é dia das lojas.
Dia de abrir liquidação do estoque anterior. Dia de conferir o caixa.
Dia de pensar na sedução mental mais eficaz, no preço-produto-preço-benefício-custo-lucro... Todo o dia é dia do dinheiro.
Do objeto de plástico. Dia do contra-cheque e dos talões de prazo.

Todo dia é dia do tempo.
Mesmo que ele sempre chegue amanhã e seja tarde demais na maioria das vezes.
Dia de abrir um presente que eu poderia não ter exatamente comprado. Todo dia podemos fabricar algumas coisas e gestos, vitrine a vitrine. Dia de prazos e jobs. Amanhã por exemplo é dia de alguém entregar um caderno de idéias, ou ser seduzido por elas.
Do relógio, da bolsa, do que se deteriora.

Todo o dia é dia de alguma gente.
Mãe, criança, pai, avô, Natal, Coelho da Páscoa. Todo dia tem um preço embutido na minha mão que te agrada.
Dia com etiqueta de lavar com cuidado. Dia pra trocar no outro, pagar parcelado. Todo dia é dia de fabricar uma canção sem som.
Do mesmo modo que olhamos em silêncio, todas as coisas querendo serem compradas por nós.

Todo dia é dia de alguma emoção com preço.
Dia de apreço, de agrado, dia de sermos tolos e financiarmos todos os sonhos dos outros. Dia de parirmos o mundo com a barriga das vontades, colocarmos tudo dentro, e não deixar nem a realidade virtual para fora. Olhar para cada coisa feita, idéia prensada em tecido. Todo dia é dia de abrir os ouvidos e os olhos para cegamente amar e nunca aprender a ouvir as vozes alheias. Todo dia somos um produto no estoque do mundo, e entendemos, preciosos, que somos algo além da mais-valia.
Da mesma prateleira, do mesmo material.

Todo dia vamos ser mais do que podemos ser.
Vamos nos vender e comprar migalhas em troca, ou trocar nossas migalhas por alguma coisa orgânica, viva ou comestível. Todo mundo vai atribuir uma figura à sua embalagem. Todo mundo vai decorar com afinco a sua propria embalagem. Mas todos somos embalagens de presente rasgados nas mãos de crianças, ou da mera ocasião.
Todos os dias nos entregaremos inteiros e voltaremos meios, vendidos e nem sempre comprados.
Todos os dias, mães de tudo, vaidosos, e filhos também: do que restou com a nota fiscal.

domingo, janeiro 30, 2011

Adeus putaria poética...

Como puderam perceber (ou não), dei uma revolucionada!
Decidi que se nem esse blog e nem aquele, pq não uma mistura de dois !
Voltamos a transmissão anterior de textos no formato que quiserem ter.
Aguardem novidades !




quarta-feira, dezembro 08, 2010

Bagagem de mão

Uma hora a vida te assalta.

Ela vem caminhando pelo seu rotineiro corpo, rouba o relógio ,e, num pulo de gato, atravessa a esquina dos olhos e deixa alguns traumas como manchas e trajetos profundos no rosto.

Rugas - deita de lado e dorme.

Hoje eu estou aqui numa esquina do Leblon - ainda jovem como a areia da praia, com as linhas que se desmontam quando vem o mar. Eu vou lembrando a cor dos momentos em eu existi nesse azul : felicidade no Arpoador, braço dado às mais levianas vontades, entregue aos verbos primeiros como ser, sentir e saber. Perdida nota de repente encontrada no instrumento. Temporal e infinita em um só momento despido de defeito como são todas as lembranças.

Acorda. Boceja. Levanta,

Bandida. A vida assalta à mão armada com seus refúgios de ontem. E então vc pergunta "que horas são?" ao primeiro relógio, "mas porque afinal se nunca temos tempo para nada, não é mesmo?" ele sorri e lhe responde como um cafajeste daqueles que vieram do Texas ou de algum lugar que tenha homens machistas e sujos em mesas de saloon. E pensa afinal que relógios nunca vão entender as horas - já q só existem em função delas, por irônico feminismo.

Não importa, é bobagem... O que importa é o tempo bandido, que levou os relógios para bem longe das próprias horas.Ele que um dia, no tipo de defeito que não escolhe sexo, vai ser a maldita razão de tudo ser fermento, manteiga e realidade. Tudo diferente do que esperamos do que seria um sonho, ou o final de dia semelhante aos filmes e pinturas.

Ontem, eu vc e Leminsky, encontramos a capa de um velho caderno e nos sentimos eternos.

Todos um dia seremos velhos e mortais. Velhos como a arte discreta e infantil de reparar nas velhas coisas. Talvez não como os velhos safados da praia do Leme, ou os velhos da Lapa, tomando uma cana ou jogando poker. Talvez eu ainda seja um dia uma velha muito moça - já que perco e não encontro o tempo. Talvez ele tenha se escondido para um dia voltar. Talvez. Ficar... velho e o tempo - a incerteza e o talvez.

Um dia eu assalto a vida. Olho pra ela dentro do meu corpo e tiro mais algumas horas para eu deitar na pedra do Arpoador - encontrada como antes. Roubo esse tempo só pra mim e quem sabe na próxima esquina eu sorrirei por lembrar de um ontem mais ontem do que antes.

E ao perceber no meu olhar inédito de antes - e agora de repente, eu deite de lado e durma por todo resto de vida que restou dela mesma. Sem tempo nem pra acordar e pensar: e se chover?

quinta-feira, novembro 18, 2010

Triste é não ser Louco (por Cláudia Rocha)

A loucura é uma válvula de escape sem escapatória.

É quase como tocar um instrumento, fazer yoga ou namorar. Ser louco é uma vaidade tão gigantesca, que muitas vezes é mais importante ser louco do que ser feliz. É assim, como se fosse uma felicidade embutida, porque, de fato, nem toda alegria é intensa como a insanidade.

Como escreveu uma vez Erasmo de Roterdã em "Elogio à loucura", lá pelos 1500 (1511, mais precisamente) destoando-se da a sobriedade dos seus contemporâneos e das técnicas monótonas que vinham sendo utilizadas: Não há diferença entre sábios e loucos, exceto que os loucos são felizes.

A felicidade da loucura não custa muito, apenas um pouco de auto-convencimento. Algo como tocar um instrumento, fazer yoga e namorar. Isso na verdade nem é uma grande sabedoria, mas está perto da natureza do louco, que acredita que toda idéia é válida, independente do vencimento que vem no rótulo delas ou da sua composição.

Apenas um louco poderia acreditar que tocar um instrumento o tornaria mais feliz ou mais rico ou mais louco , ou ainda que viver em sociedade é uma necessidade de segurança baseada no papel desempenhado por uma instituição chamada Estado. Somente um louco faz uma música social, achando que pelas palavras cantadas, alguém pode perceber o que não se percebe ao falar. E dessa forma, percebendo o "de repente", a loucura seria o remédio para todas as coisas (exceto alguns genéricos de farmácia).

O humor de um louco a fazer yoga, e pensar, ironicamente que se concentrar em seu cerne animal o torna mais controlado com o seu corpo do que o resto do mundo. De fato... nem um pouco o que ele proprio consome ou repulsa, afinal... Ele tem a nítida noção de que sua cabeça é um universo aberto propagando o On (liga do desliga há!) de tudo que gira ao seu redor. A sua cabeça não lhe pertence. Cortem-lhe a cabeça. Ele é louco, (pausa para risos)

A pior das felicidades loucas é namorar. Se vc ao perceber que não pertence a si e nem que suas idéias absurdas que "oh!acabam tendo um fundo de verdade para alguém em algum lugar no kilometrico universo", mesmo que esse alguém de fato nunca exista, pois é... intuitivamente vc se apaixona. Vc encontrou o alguém! (salva de palmas) Coitado, ele, o alguém!, carrega - no seu pálido corpo rasgado de uma humanidade heróica - toda a dose de adrenalina e tesão que você (mísero ser destrambelhado) aprisiona na sua hipófise e nas suas neuroses. Vc está amando, ou seja...: vc enloquece sem poréns e põe a culpa na outra pessoa - isso se a (mal)dita não fizer isso antes de você!

Portanto, se vc beira o auto-controle definitivo, mantém certos horários e padrões, dá "ok" em suas atividades cumpridas, arruma a cama e dobra os lençois, não come carboidratos à noite, cuida de 7 filhos, 10 cachorros, 19 gatos, faz yoga, toca um instrumento (harpa?) e namora e... e ainda é feliz!... Acredite... Vc não é feliz porque toca um instrumento, faz yoga ou namora. Vc é feliz porque é completa e - estupidamente - L-O-U-C-O,


                    

domingo, agosto 01, 2010


Composição (por Cláudia Rocha em julho de 2010)

Um dia vão olhar
E ver uma clave de Sol
No meu lugar

Porque eu canto pra não despertar
O dormir que decidiu esperar
pra quando eu acordar daqui

e vc me dizer
com sua boca de veludo
uma frase enfarpada de absurdo

um dia vão me olhar
E ver uma nota em ligato com o céu
sem tocar o chão

Porque eu canto pra não ser eu
Pra não chamar atenção
pra quando eu acordar daqui

e vc me dizer
com sua alma de instrumento
um solo ardendo de flores.

e vc me dizer
com seu ouvido, seus olhos
a melodia/amor que não sai da minha cabeça


quarta-feira, fevereiro 24, 2010

Projétil (Cláudia Rocha - janeiro de 2008)

Eu estou só
Querendo que a noite permaneça
Enquanto eu me mudo
Do minuto de agora
E refaço o mundo
Com a largura de um sorriso
De lembranças passadas

Estou só eu
E a tela fria do tempo
Brincando de futuro
Risonha têmpora de amanhã
Despertada no dia quieto
Eu estou só no plural dos verbos

Esqueçam, vcs neurônios
O segundo e o primeiro desejo
Que fizeram anteontem à sua invisivel estrela
Larguem, vcs braços
O amor não dado à sua palma
Ao arremesso de platéia, vagos
Sonhos esses que vcs deram n'água
E não voltaram nuvem

Sejam, vc - imagem, espelho
Uma pista mínima pro território
Dos olhos e pernas
O enxergar mais que o olhar
E o pisar mais do que o existir

E me recolho só
As muitas de mim mesma na imensidão
Apagando os fósforos de cada dedo
De cada gesto seu que é aquém
Numa ciranda de mãos às idéias
Ressonando e me vendo dormir
Quase caindo do teto do porém
Do existir

quarta-feira, fevereiro 17, 2010

O dito pelo não dito

Poesia primeira (por Cláudia Rocha/ 31/12/2009)

Como se eu fosse inteira
construida de vazios
E matérias
Eu gostaria de ser o silêncio
sapiente das coisas concretas

Mas como sou de água
Odor e alfabeto
Apenas posso ser
Humana, gesto
e instrumento

Se eu pudesse ser astro
Teria menos dores de cabeça
Soltaria raios nos olhos
E queimaria meus inimigos

Mas por ser mulher
Apenas evaporo como a nuvem
Matéria fêmea
E humano vazio

E seria flor até
Se alguém me desse
Um puxão arrancador da terra
Mas meu homem cheira os cabelos
E apenas me deixa na lama
Das raízes bem presas

Eu seria mais livre
Se não fosse esse corpo
Ao fundo do copo
Que você bebe

Mais penumbra
se não fosse essa luz
Que os seus olhos procuram
Com tanta sede e fome

E se pudesse ser de outra õrbita
Seria um satélite à parte
Uma Lua entre Vênus e Marte
Inabitada para não ser planeta









terça-feira, fevereiro 16, 2010

A paixão de cinzas



(por Cláudia Rocha - 2009/dezembro)

Moça que me olha da janela
Não quero ouvir mais dela
Um som saindo da boca

Quero dizâ-la, acordá-la
E deixá-la acesa
No apagado da noite toda

Vou sentir o frio de seus membros
Ainda mais frios por dentro
E ainda mais frios por serem menos meus

E por mais que me olhe do outro lado
A entenderei o tom amrgo
O piano molhado de música
E os lábios

Moça que se perde na estrada
E me olha na janela
Não quero ver sua cara
Sua palidez de fada

Quero deixá-la fadada
Deixá-la acesa a noite toda
No apagado da lembrança

Como uma dança de ontem que me recusou
Como um beijo de hoje maldito
E um não que não pensou

Um grito

Moça molhada na minha janela
Espelho de uma realidade estúpida
De um mundo onde o pensar raivoso
Não é semente ou sequer murta

Ela está morta, sujeito
Ela, moça, paixão
Não se levanta do meu peito

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

É Carnaval - o ano começou com confetes .º. º;º..

O pOEMA CRU

(por Cláudia Rocha - fevereiro 2010)


Te encontro os olhos rudes
Brincando na boca larga
A voz da minha tragédia em silencio

E como se não tivessse dimensão para ir
Eu parto o que não compartilho
essa tua firmeza de círco
Nos traços emprestados do palhaço

Eu te sorrio pra não chorar
E te encontro, incontestável
Ainda gemendo, alardeado
A voz do mais profundo amor

Ainda que de amor não seja feita a vida
A gente pinta o borralho de sangue
E a inocência escorre pura
Nas veias das flores arrancadas

Ainda que de vida não sejam feitas
As palavras que vc morde aos solavancos
Eu te olho tímida - e profundamente
E sem querer partir
Te amo, destemperadamente
A voz que se cala
com o coração batendo


sexta-feira, dezembro 25, 2009

...

Realidade espacial 
por claudia rocha - novembro de 2009

Então o tempo já passou
Já acabou o carnaval
Já choveu um céu de confete
Já molhou-se a calçada da frente
Repentina serpente mudando o papel
De que a realidade é um sonho
Todo meu e todo seu

Então já está um breu
Nesses olhos acesos que foram
Morreu um pedaço do eixo, cambaleio
Torto e à direto sem consolo
Vou sem meu braço dado
Ao que restou do passado

E agora que eu preciso respirar
Que eu preciso aparecer na janela
Ter um mundo
Vulgar
ou que seja
Pra eu chamar de mim mesmo
Independente do que seja
Esse eu agora sem vc

Então restou alguém atrás das roupas
Restou a rua inteira e a secura
A calçada da frente parece mais segura
Preciso andar pra outros lados desta Lua

Hoje eu já amanheci um céu
Nesses olhos de mar diluido
Morto em pedaços de sexo, me esqueço
Mas te esqueço também proibido

E vou sem meu espelho sorrindo
Sem precisar ver pra crer que estou vivo

terça-feira, dezembro 22, 2009

Rastros de lençol
                                         (setembro de 2007) por Cláudia Rocha

Meu amor me beija e me joga na cama
Me descabela e me embeleza de calor nos olhos
Meu amor vira sonho e fecha todas as frestas
Pranão ver a clausura do Sol
Entre a janela e o praíso do quarto
Meu amor deixa o mundo de quatro
braços, lábios traços-desejos emoldurados
E vira esquadro nos meus ombros
Construindo cada gemido no espaço
E funde seus largos nas minhas frontes
Inaugura uma cidade em cada roteiro
Em cada lacuna que o beijo
E vejo cada rastro
Lembro da rasura de desejo e inocência
Que a gente se desmembra e refaz
Com o mais puro e ardor abstrato
Concreto sobre concreto nos ais
Eu fecho os olhos e o vejo
Coberto por sobre meus nus retalhos
E nos acabamos, patetas, felizes,libertinos
Gozados, gozados